domingo, 2 de maio de 2010

Conto : "O Fantasma das Quatro Horas"

Primeira Parte

A nova casa da família Goulart ainda estava bagunçada por causa da mudança.
Mesmo tendo deixado alguns móveis pra trás, por insistência de Marta, o volume de caixas pelos aposentos era enorme.

- Precisamos comprar alguns móveis novos. - dizia ela.

- Amanhã iremos até o centro da cidade, querida. - respondia Fernando, seu marido.

Sofia, a filha do casal, ficara com o quarto maior enquanto Pedro, seu irmão mais novo, alojou-se no cômodo mais próximo do quarto dos pais.
Durante duas semanas aquela bagunça foi diminuindo e a nova casa já estava quase toda mobiliada. Papéis de parede e móveis sob encomenda.
Os enfeites e utensílios foram adquiridos em antiquários, já que Fernando apresentava certa queda por coisas antigas. Colecionava discos, livros, aparelhos eletrônicos e tudo muito velho e usado. Por esse motivo, a família não estranhou quando, naquela manhã, ele entrou pela sala com aquele relógio esquisito.

- Olhem só isso! Este relógio, no mínimo, deve ser do século passado! E foi quase de graça!!!

Quando o relógio badalou pela primeira vez a reação dos moradores foi um tanto espantosa.
Pedro assustou-se com o barulho e foi refugiar-se nos braços da mãe. O silêncio que veio depois só foi quebrado quando Sofia expressou, sinceramente, a sua opinião.

- Horrível, este relógio! Me arrepiei toda, credo!!!

O relógio estava bem conservado pelo Tempo. Todo trabalhado em madeiras nobres.
Abaixo dos ponteiros, pendia o badalo moldado em prata. A cada hora que se passava, a peça iniciava seu canto triste e essas badaladas eram sempre motivo de susto nos novos inquilinos, que após aquela barulheira fantasmagórica, possuiam apenas sessenta minutos de silêncio antes de nova remessa de terror.

- Fernando, meu bem. Você tem que se livrar disto - dizia Marta, apontando para o relógio.

Mas Fernando não ouvia as lamentações da mulher. Parecia estar sob o encanto do tic-tac constante daquela relíquia. Seu amor pela peça foi tornando-se cada vez maior. Cada vez mais forte. E, constantemente, Marta via seu marido levantar-se da cama, descer as escadas e parar em frente ao relógio, no meio da madrugada. Até que, em certa noite, Fernando desceu por volta das quatro da manhã e não mais voltou para o seu quarto.
No dia seguinte, Marta desceu as escadas para fazer o café, como já era de costume, e viu Fernando deitado no sofá.  Tentou acordá-lo, mais de uma vez, em vão.
Estava morto.


Fim da Primeira Parte

Um comentário: