Parte Três
Carapicuíba, 6 de Setembro de 2.002.
Agora, Malaquias era um deles. Não pensava e nem mesmo respirava. Só queria comer.
Entre os vivos e desesperados, havia uma senhora com a neta nos braços. O cheiro da carne fresca guia Malaquias até sua presa. A criança. A pobre e indefesa criança.
Ele a arrancou dos braços da avó e preparava-se para dar a primeira mordida quando seu cerebro foi atingido pelo poder de fogo e calor de uma bala certeira. Malaquias caiu no chão.
Não estava vivo, não estava morto, e não mais se mexia.
- Pegamos mais um, Sargento! - disse o Cabo Pereira enquanto resgatava a garotinha.
- Venha, depressa! Entre no carro! - responde o Sargento Mello.
Os dois oficiais do exército, até o momento, haviam resgatado três pessoas, contando com a menina. Estavam todos no banco de trás, com muito medo dos mortos-vivos. Cabo Pereira estava apreensivo.
- Isso não vai acabar nunca? Até quando teremos que ver os mortos voltando a vida?
- Não importa o tempo que isso dure, o importante é o que podemos fazer até que isso acabe. Não podemos ignorar a existência de sobreviventes, mesmo que não possamos fazer muito a respeito. - respondeu o Sargento.
- Pra onde a gente vai levar essas pessoas? Não há lugares seguros, Sargento!
- Vamos levá-los até o posto policial. Fica aqui perto. De lá, pediremos reforços. O que me preocupa é este seu ferimento na perna. Tem certeza de que está bem?
- É claro que sim, Sargento! Não vou me tornar uma dessas coisas aí fora!
- Espero que não, rapaz. Espero que não.
Ao chegarem no posto, encontraram-no com as luzes apagadas. Parecia que não tinha ninguém ali.
- Vamos entrar! - ordenou o Sargento.
A porta estava trancada por dentro, foi preciso empregar a força para abri-la.
Lá dentro, silêncio e surpresa. A policial, jovem e precavida, escondeu-se embaixo do gabinete. Estava em posição de defesa. Saiu rapidamente de seu esconderijo com a pistola empunhada, apontando para os recém chegados. Mas, vendo que eles não eram os inimigos, desculpou-se de imediato.
- Pensei que fossem os monstros, me ajudem! Por favor, eu estou com muito medo!
- Mantenha a calma, soldado! - respondeu o Sargento.
As palavras, agora, só ecoavam na cabeça do Cabo Pereira. Seu corpo estava esquisito, parecia estar mais pesado. E uma fome inexplicável. Já estava fora de si quando agarrou o Sargento Mello pela farda e comeu a sua orelha. Os demais sobreviventes fizeram tudo para viverem o máximo possível. No entanto, a fome do soldado era maior do que seus esforços. Um à um, todos foram devorados. Mas ainda haveria mais carne para saciar a fome do soldado, pois o dia só estava nascendo.
Continua...
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